Governo diz que vai identificar e punir policiais suspeitos de ajudar facção

Brasil
O governo de São Paulo disse nesta segunda-feira (14) que usará dados da investigação do Ministério Público (MP) para punir policiais suspeitos de ajudar integrantes da facção que age dentro e fora dos presídios paulistas. "Designamos uma equipe especial da Corregedoria para avaliar e verificar denúncias de policiais envolvidos", disse Geraldo Alckmin.

Escutas obtidas após três anos de investigações do MP sobre a quadrilha concluíram que o grupo controla 90% dos presídios de São Paulo. No mês passado, os promotores denunciaram 175 acusados à Justiça e pediram o isolamento dos 35 principais chefes do bando no Regime Disciplinar Diferenciado (RDD). Todos os pedidos foram negados. O Ministério Público já entrou com recurso.

O secretário da Segurança Pública, Fernando Grella Vieira, disse nesta segunda que já foi solicitado acesso a todo o material coletado pelos promotores para buscar a identificação de policiais e puni-los.

No fim da manhã, Alckmin e Grella participaram de reunião com o secretário da Administração Penitenciária, Lourival Gomes, o comandante da PM, coronel Benedito Meira, e o delegado-geral da Polícia Civil, Maurício Blazeck. Ao sair do encontro, o governador anunciou a criação de uma força-tarefa com representantes das pastas e das polícias cujo objetivo é obter informações de inteligência para facilitar o combate ao crime organizado.

Alckmin também afirmou que em dezembro devem começar a ser instalados, em 23 unidades prisionais do estado, bloqueadores de celulares. Segundo o tucano, os antigos equipamentos eram ineficientes. “Nunca se teve tecnologia adequada. Ou não bloqueava ou bloqueava [os celulares] de todo o bairro.”

No primeiro semestre, o governo testou, com sucesso, o novo equipamento nos presídios de Pinheiros, Belém e Guarulhos. A licitação foi aberta. Para o secretário da Segurança, a instalação de bloqueadores não irá atrapalhar investigações como a do MP, que foi baseada em escutas telefônicas. Segundo ele, o estado tem outras maneiras de monitorar o crime.

Escutas
Gravações telefônicas autorizadas pela Justiça mostram policiais colaborando com traficantes de drogas da facção em troca de propina. Nas interceptações telefônicas feitas em celulares, um criminoso que está nas ruas pergunta a um policial militar qual o valor da propina para soltar uma traficante presa na capital. Em outra conversa, um PM oferece ajuda para transportar a droga usando motos da própria corporação.

Numa das gravações feitas com autorização da Justiça um traficante da facção que atua nas ruas, indentificado como Boy, tenta negociar com um PM a libertação de uma traficante que foi presa dentro de um ônibus, na cidade de São Paulo, quando transportava cocaína para a quadrilha.

Boy: E aí? E a menina aí, tem ideia [propina] ou não?
PM: Não, ela já tinha sido presa já, né? Foi a Rocam [Ronda Ostensiva Com Apoio de Motocicletas] que pegou ela.
Boy: É?
PM: Alguém caguetou que ela tava dentro do busão.

As investigações revelam ainda que um policial militar usou um celular da corporação para conversar com o traficante. E que ele falava de dentro de uma delegacia do Morumbi, na Zona Sul da capital, onde localizou a mulher presa, a pedido da quadrilha. Na conversa o PM ainda ofereceu ajuda pra transportar drogas.

PM: Eu sou PM também, só que como eu…, a caminhada é outra, tem outra ideia pra trocar. Eu colei nela [na traficante], já sei que a lojinha [ponto de venda] é dela. E já deixei uma linha direta aí pra quando ela quiser fazer um transporte [de droga], fazer uma coisa segura e com quem confia entendeu?
Boy: Hã, hã…
PM: Tem os menino que trabalha com isso aí. É PM também. Vai de motinha. Entrega lá, recebe e vai embora.

As gravações registraram mais uma conversa do criminoso. Desta vez ele foi flagrado acertando o pagamento de propina para outro policial militar.

Carlão PM: E aí? To descendo aí
Boy: Tá bom, o menino tá lá [com o dinheiro] em frente onde eu fico lá, entendeu? De dia.
Carlão PM: Beleza, perto do mercadinho lá?
Boy: É.
Carlão PM: Beleza então.

Em outro grampo, um preso conhecido como Tuta, que é um dos chefes da quadrilha, é alertado sobre a movimentação da Força Tática da Polícia Militar, em torno de um ponto de venda de drogas. Quem o avisa é Boy, criminoso que atua nas ruas. As interceptações telefônicas foram feitas em celulares usados pelos policiais e bandidos. É de dentro dos presídios do interior paulista que os criminosos comandam o tráfico de drogas, por telefone celular.

Boy: Só tá meio estranho aqui com os fiscal [policiais] entendeu?
Tuta: Os caras de moto, né?
Boy: De moto e daquela grande, sabe?
Tuta: Sei.
Boy: Daquela perua grande.
Tuta: Sei.
Boy: Então, ele não usa aquele boné. Usa aquele gorrinho

Na sequência, Boy, o traficante solto, reclama que vinha pagando propina regularmente.
Boy: Eu passei para aqueles fiscal [PM] que nóis paga aqui, que é o seguinte: se eles não resolver esse negócio aí, não tem a mensalidade [propina] deles. Inclusive essa semana eu não mandei nada ainda, entendeu?

O que diz o governo de São Paulo
Por meio de nota, a Secretaria da Segurança Pública (SSP), informou que o secretário da pasta, Fernando Grella, considera que "policial envolvido com criminoso não é policial, mas bandido. Deve ser expulso do serviço público e punido de acordo com seu crime".

O comunicado também afirma que, por determinação do secretário, as corregedorias das polícias Civil e Militar vão usar as informações obtidas pelo Ministério Público para apurar os fatos e punir os culpados. "Para isso, a SSP aguarda o compartilhamento oficial do conteúdo da investigação, o que tem de ser feito por determinação judicial.” O processo corre em segredo de Justiça.

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