Riad, 28 set (EFE).- ‘O Sonho de Wadjda’ (2012), o primeiro filme rodado totalmente na Arábia Saudita e dirigido por uma mulher, voltou a fazer história ao se tornar o primeiro que o país apresenta ao Oscar.
‘Tentei com muito esforço fazer um filme sincero que representasse minha cultura, além de refletir a imagem da minha comunidade. Esta indicação (ao Oscar) é um reconhecimento por todos esses esforços’, contou à Agência Efe a diretora Haifaa Al Mansur, por telefone.
A trama narra as restrições impostas à mulher saudita em um país conservador através da história de uma menina que sonha em ter uma bicicleta para brincar junto com o filho de seus vizinhos, Abdullah.
A intenção de Haifaa era fazer um filme do qual os sauditas tivessem orgulho e com o qual se identificassem, e ela não oculta seu desejo de que um dia o cinema chegue a fazer parte da cultura de seu país.
No lançamento da candidatura saudita ao Oscar, o presidente do comitê de indicações da Assembleia Saudita de Cultura e Arte, Sultan Bazie, explicou na semana passada que escolheram o filme porque ele ‘mostra a realidade como ela é’.
”O Sonho de Wadjda’ possui todas as características exigidas pelo Oscar’, afirmou Bazie sobre o filme, que ele acredita ter condições de ser selecionado como o melhor estrangeiro.
Apesar da permissão das autoridades, o filme não foi lançado na Arábia Saudita, país em que está proibida a abertura de salas de cinema e onde os produtores locais enfrentam grandes desafios para poder filmar dentro das cidades.
Haifaa conseguiu vencer estes obstáculos e gravar algumas cenas nas ruas de Riad e em escolas de meninas, sempre com a permissão do governo.
Mesmo assim, não pôde trabalhar diretamente com sua equipe porque teve que ficar dentro de um veículo e dirigir os câmeras por walkie-talkie.
‘Riad tem uma magia especial que eu quis ressaltar no filme para que as pessoas pudessem conhecer a beleza do meu país’, disse Haifaa.
‘O Sonho de Wadjda’ já estreou em salas de cinema de diferentes países do mundo e ganhou vários prêmios, como o de Melhor Filme e Melhor Atriz no Festival de Cinema Dubai e o de Público no Festival de Freiburg (Suíça).
Além disso, venceu o prêmio do Cicae (Confederação Internacional de Cinemas de Arte e Ensaio), que ocupou mais de três mil salas em 28 países europeus, durante o Festival de Cinema de Veneza de 2012.
No entanto, para Haifaa, não é só o reconhecimento internacional que importa, mas também o de seus compatriotas, que só puderam ver seu filme em DVD por causa da ausência de cinemas.
Além disso, o filme estreou no Bahrein, onde, ela garante que atraiu um bom número de membros da comunidade saudita que vivem no arquipélago.
Para a diretora, o interesse dos sauditas pelo filme é a prova das mudanças positivas no país.
‘Queria passar uma imagem humanitária e bonita da Arábia Saudita, que surgisse do interior da sociedade para que todo o mundo pudesse conhecê-la de uma maneira diferente do que se publica nos jornais e nas revistas’, explicou Haifaa.
No filme há uma crítica aguda a esta sociedade, embora de maneira sutil para não chocar diretamente os mais conservadores.
O objetivo de Haifaa é que o filme seja um marco no país, a partir do qual se inicie uma mudança profunda, afastado de polêmicas políticas.
‘Eu respeito todas as ideologias, tanto a conservadora como a liberal – confessa -. Quero refletir sobre o meu caso, mas sem cair em frivolidades’.
De fato, a história está inspirada na vida da produtora, que foi criada em uma pequena cidade da Arábia Saudita, submetida a muitas regras no seio de uma família tradicional, mas ao mesmo tempo aberta, o que permitiu que ela crescesse com mais liberdade que outras mulheres.
Haifaa estudou literatura no Cairo e cinema em Sydney, e atualmente vive com o marido, que é americano, e os dois filhos no Bahrein. Mas nada disso a impediu de se transformar na primeira cineasta saudita e nem a afastou de sua meta principal: fazer filmes que refletem a realidade de seu país.