Nos cinco jogos do Campeonato Brasileiro realizados no principal estádio do Rio de Janeiro até agora, a média é de quase 25% de gratuidades, formadas por ingressos de cortesia, obrigatórios por lei estadual para idosos, menores de 12 anos e portadores de deficiência. As 4.961 cadeiras cativas disponíveis no estádio entram na conta divulgada pelos borderôs no site da CBF, embora nem sempre sejam ocupadas em sua totalidade.
Além das gratuidades, a média de meias-entradas por duelo é de 39%. Com isso, apenas 36% dos torcedores teriam restado para adquirir os ingressos cheios. Mas ainda há as promoções dos programas de sócio-torcedor dos clubes, que permitem descontos de 50% ou até mesmo não cobram pelo ingresso.
No clássico entre Flamengo e Botafogo, por exemplo, jogo com maior público (52.361 pagantes e 38.853 presentes) e maior renda (R$ 3.082.555,00) do Brasileirão no novo Maracanã até agora, o clube rubro-negro e o Consórcio poderiam ter arrecadado bem mais se a lei das gratuidades fosse mais amena. Se as 7.961 pessoas (apenas idosos, menores de 12 anos e deficientes, sem contar cativas e cortesias) que entraram gratuitamente no estádio tivessem pago pelo menos meia-entrada do setor mais barato, que custaria R$ 50 cada, a arrecadação teria aumentado em R$ 398.050,00.
Apesar dos diferentes planejamentos financeiros e contratos assinados com o Consórcio Maracanã S.A., Flamengo, Fluminense e Botafogo, e o Vasco, que já mandou jogo no local, entram em sintonia na reclamação quanto a gratuidades e meias-entradas.
"Eu costumo fazer uma associação. Uma brincadeira, que é verdadeira: eu vou ao supermercado e não vejo ninguém com mais de 60 anos saindo com um frango de graça. A gratuidade dos ônibus é paga pelo Governo. Só no futebol e no espetáculo de diversão que o clube é obrigado a pagar a gratuidade. Esse exemplo foi dado, oito mil ingressos gratuitos em um jogo de 40 mil é um absurdo", disparou Sergio Landau, gerente executivo do Botafogo.
No Rio de Janeiro, a primeira lei estadual a abordar gratuidade em estádios e ginásios esportivos é datada, de acordo com a Comissão do Esporte e Lazer da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), é a 1.833 de 1991, que concedia entrada gratuita em ginásios, ginásios esportivos e parques aquáticos a maiores de 65 anos. De lá para cá, outras três leis intensificaram a gratuidade em praças esportivas no Rio de Janeiro. A lei 2.051, de 1992, concedeu o benefício a portadores de deficiência. Em 1996, a lei 2.562 instituiu que os maiores de 65 anos podem entrar nos estádios apenas com a apresentação da carteira de identidade. A lei mais recente sobre o assunto, número 4.476, de 2004, estendeu o direito da gratuidade a menores de 12 anos nos estádios.
"A lei preocupa diariamente, a lei não te dá nem um piso e nem um teto, não dá para planejar. A gente planeja ter 10% de gratuidades, mas aí o torcedor chega lá com o documento, e a lei te obriga a deixar ele entrar. É um benefício que estão dando à sociedade, mas nós não somos incentivados a fazer isso. Tem que ter um equilíbrio, talvez uma nova lei", afirmou Carlos Eduardo Moura, gerente de arenas do Fluminense.
A falta de limite para gratuidades permite casos que saltam aos olhos, como o ocorrido na partida entre Vasco e Atlético Mineiro, em Volta Redonda, no dia 8 de junho. Do púbilco presente de 2.227 pessoas, 1.143, ou 41,7%, não pagaram para entrar no estádio. Um golpe no cofre dos clubes. As gratuidades preocupam também o Flamengo, mas a enorme quantidade meias-entradas praticadas em jogos em todo o Brasil é o motivo da discórdia.
Criticada pelos altos preços dos ingressos em seus jogos, a diretoria rubro-negra se defende, argumentando que em Brasília, onde o clube já mandou quatro partidas no Brasileiro, há situações em que 95% dos ingressos são vendidos pela metade do valor. O clube propõe uma discussão sobre o tema.
"É um grande absurdo o fato de não haver um limite de meia-entrada. Aqueles que pagam a inteira têm de balancear o preço do ingresso pelos outros. É o gato do futebol. Como ocorre nas contas de luz e água, todos nós pagamos mais por quem não paga ou paga bem menos. É fundamental você rediscutir essa política de meia-entrada para fazer um preço mais justo para todo mundo", afirmou o vice de finanças do Flamengo, Rodrigo Tostes.
A falta de fiscalização dos documentos de meia-entrada também incomoda os clubes e prejudica financeiramente. Segundo a diretoria do Fluminense, se houvesse um forte controle no acesso de quem, de fato, possui este direito, como o clube fazia no Engenhão, a arredacação subiria em 12,5% em relação à receita bruta. Antes, com maior fiscalização, o Tricolor, explica que 60% dos ingressos vendidos eram de valor inteiro e 40% de meias-entradas, agora esses números se inverteram para 40% e 60%.
Laterais do Maracanã vazias
Os cinco primeiros jogos entre clubes no Maracanã mostraram uma nova configuração de torcidas, criada pela diferença de preços nos ingressos. Com isso, as cadeiras laterais do estádio ficaram praticamente vazias, enquanto os setores atrás dos gols encheram, principalmente nos clássicos.
Na partida entre Fluminense e Cruzeiro, por exemplo, o bilhete mais barato vendido pelo clube tricolor custava R$ 40, contra R$ 180 para o mais barato comercializado pelo Consórcio (ambas inteiras). No Fla-Flu no próximo domingo, esta diferença entre os valores cai para R$ 80 e R$ 120.
Questionado pelo ESPN.com.br sobre a situação, o Complexo Maracanã Entretenimento S.A. admitiu que deve baixar os preços dos ingressos centrais, mas destaca os benefícios oferecidos nos setores VIPs.
"A concessionária está buscando junto às agremiações maneiras de reduzir os preços dos ingressos na arena, sempre levando em conta que o projeto pretende garantir uma nova experiência para o torcedor. Vale lembrar que, na composição do preço do ingresso, constam todos os benefícios oferecidos p
ela arena, como organização do jogo, conforto, serviços colocados à disposição do torcedor, custo operacional e qualidade do local, por exemplo", disse, em nota oficial.
O presidente do Consórcio, João Borba, confirmou a intenção de ajustar os valores e buscar um equilíbrio para que o Maracanã seja frequentado por torcedores de diversas camadas sociais, como ocorria no passado.
"Nós só fizemos quatro jogos no Maracanã. Hoje a gente está fazendo sensibilidades. Nosso interesse é trazer as famílias, trazer o povo para encher o Maracanã. Vamos fazer isso num curto prazo, vamos encontrar um equilíbrio que a gente consiga pagar as contas e que a gente consiga trazer o povo", explicou Borba.
Para o clássico entre Fluminense e Flamengo, neste domingo, o Consórcio já adotou uma medida para baratear o custo dos bilhetes nos setores da lateral. Após uma parceria com o jornal "O Globo", o torcedor que levar o cupom publicado até a bilheteria terá 50% de desconto na entrada.
Em relação às gratuidades, o Consórcio garantiu que elas constavam em seu planejamento financeiro e que vai continuar respeitando a legislação vigente. O problema já ocorre há muito tempo e perturbou os dirigentes durante o Campeonato Carioca. Com cofres apertados, os clubes estudam maneiras de evitar maiores prejuízos, ainda que amarrados pelas leis estaduais.